Ela estava com a vida feita, seus dois filhos já na faculdade e seu marido com o bom emprego de sempre. Resolveram se mudar, já moravam naquele apartamento fazia quase vinte anos e então, dentro de uma caixa, que estava dentro de outra caixa, ela achou aquele envelope. Ela resolvera não jogar fora, mas esconder de um jeito que a convencia de que aquilo não existia mais. Nem sabia porque resolvia sempre enganar a si própria daquele jeito tão infantil, mas ela escondeu lá em cima do armário, dentro daquela caixa velha, mas achou. O envelope já amarelado fez passar um filme em sua cabeça: descalça, descabelada, pulseiras no pé, cabelos compridos, a areia macia, e as gargalhadas, ah... as gargalhadas! Não sabia mais o que era isso fazia muitos anos. Só sabia o que era uma risada a toa, um sorriso educado, nada além... Não ia encarar, claro que não. Seria um divisor de águas abrir aquele envelope, não mesmo. Mas abriu.
"Oi querido,
Gostaria de saber como você e todo o meu amor estão. Sim, todo o meu amor está com você.
Gostaria de saber dos seus pelinhos dourados, e dos seus pés sempre sujos....
Eu não vou lhe entregar esta carta... Depois de todo o meu esforço de te deixar ir, eu não poderia fazer isso.
Gostaria que soubesse que não fui com você porque precisava de mais responsabilidade na minha vida. Não poderíamos viver de amor, apenas, meu bem. Eu não podia deixar meus estudos, preciso me formar, já tenho um emprego... Eu queria mesmo era que você entendesse, mas você não entendeu.
Eu te amo com toda a minha alma e sei que não vou suportar a saudade de você e do meu amor. Foi muito difícil pra mim te dizer tudo com tanta racionalidade, depois daquela temporada que passamos acampando pelas cachoeiras da Chapada, e daqueles dias na praia, em que dizíamos que a cama perfeita era uma "canga na areia", e que teríamos que arranjar um jeito de colocar a cama perfeita na nossa casa... Foi um pouco bobo da minha parte. Era óbvio que você não estava acreditando, eu tava mentindo descaradamente quando disse que preferia uma vida estável, com tudo bem certinho.
Você me conhece como ninguém, e olhava pra mim sem entender nada. Foi quando se virou e foi embora pra sempre. Sua mochila velha e rasgada implorava pra eu ir com vocês e eu a olhava tendo a certeza que todo o meu amor estava lá dentro.
Nem olhou pra trás, eu fiquei lá, parada, tentando me convencer de que tinha tomado a atitude certa, mesmo tendo a certeza de que ficaria sem amor pro resto de minha vida.
Te escrevo pra aliviar um pouco a minha dor. Meus olhos não se cansam de chorar. Acho que não vou nunca mais pra praia, pois sempre vou imaginar a nossa cabana lá, toda de madeira, com um banquinho na frente...
Me desculpe por tudo, me desculpe por te fazer sofrer.
Cuide bem do meu amor."
Ela não sabia....
Não sabia que eles sairíam de mãos dadas com mochilas velhas e rasgadas, parariam numa praia e dormiriam na cama perfeita por algumas noites... Ele teria a idéia de ensinar surf, ela iria organizar a escolinha. Eles eram tão perfeitos e tinham uma harmonia tão linda, que encantava quem os via. E alugariam uma cabana, não era na areia, como queriam, mas era na rua de trás, embaixo de árvores, pois o sol iria aquecer muito a madeira. Organizariam luais, com violão e bebidas típicas. Seriam convidados pra viver na Indonésia, e trabalhar numa ONG que ensinava Surf pra crianças carentes. Iriam, com as mesmas mochilas velhas. E de lá, viajaríam pelo mundo, ensinando crianças carentes, aprederíam várias línguas, teriam muito dinheiro, que não serviria para luxo, mas para viver melhor. Felicidade era uma coisa tão grande e eles tinham tanta, que resolveriam espalhar pelo mundo, com seus dois filhos. Criariam suas próprias ONGs e terminariam suas vidas confortavelmente, no lugar que quisessem e olhariam pra trás tendo a certeza que fizeram a diferença e distribuiram amor pelo mundo.
Ela fechou a carta e com os mesmos pés descalços, foi até a praia. E percebeu, que com tudo que ela ganhou, só perdeu.
Tarde demais.
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
domingo, 6 de fevereiro de 2011
Oi Fred!
E aí? Tudo bem?
Me desculpe escrever tanto tempo depois. Faz o quê? Uns onze anos? Foi mal mesmo, mas sabe o que foi? Aquel trilhões de e-mails que vc me mandou, eu nem li. Aí não soube o quão fudido eu te deixei... Mas também nem me importou muito na época, eu fiquei com um gatinho que hoje é ator da Globo naquele 18 de fevereiro... Agora até deu pra me perdoar um pouco, né? Ou não? Ah, nem venho aqui te pedir desculpas não, vim te dizer o que aconteceu mesmo. Talvez você tenha sido o primeirão da minha lista. Talvez não, com certeza.
Então, foi o seguinte, você foi a primeira pessoa por quem eu fui apaixonada, e paixão acaba. Quando se tem 17 anos, ela acaba e por você ser imatura, nem dá explicação, mete o pé mesmo, e foi isso que eu fiz. Mas como homem é sempre burro, você ficou lá, se perguntando o porquê de tudo e citando Aristóteles.
Numa boa? Aristóteles e eu não temos absolutamente nada a ver...Acho o cara um pé no saco.
Mas foi isso, querido. A paixão acabou da noite pro dia, um dia eu te amava e achava lindo você tocando sax, falando francês e jogando golfe e no outro dia eu não te amava e achava um pouco brega você tocar sax e jogar golfe. Francês eu continuava achando um charme, mas isso eu não disse pra ninguém.
Ah! Obrigada pela sua carta, foi fofa. Foi digna de alguém que era pra ser o homem da minha vida, você tá de parabéns. Me fez chorar, aliás, me desesperou de tanto chorar, nunca tinha o feito por ninguém. Sério, mandou bem. Eu lembro de ter deitado na cama e achado que ia morrer, pra depois a guardar e não abrir por muitos e muitos anos.
Ô Fred, é um porre falar de você porquê eu me sinto eternamente culpada de ter estragado tudo, sério mesmo, minha mãe me enche o saco dizendo que você era perfeito e não entende porquê eu te larguei.
Você é chato. É muito chato. Um chato!!! Que merda, um chato, chato, chato!!!!!! Chato! Puta que pariu! Por que eu fui tão sacana com você? Por que eu fui reler sua carta muitos anos depois e vi um pedacinho de papel nunca antes visto, escrito:"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Pequeno Príncipe." Porra!!! Custava ser menos inteligente? Eu tinha mesmo que passar alguns anos da minha vida sentada na janela ouvindo você tocar sax lá do sétimo andar?
Ok, estou te promovendo. Meninas, entrem na fila, ele é mesmo tudo isso.
Não vou nem dizer que você é lindo, carinhoso, viaja bastante, se formou em economia, rico, inteligente, dirige um carrão e além de tudo isso, como se não bastasse mais nada, é educado.
Enfim, pra deixar bem claro e terminar de formar toda a imagem podre que você tinha de mim depois de eu ter te deixado entregue às traças, eu resolvi te escrever, você resolveu corresponder, me chamar pra sair, eu por minha vez, aceitar e você ter ido me buscar em casa no seu carrão.
Bem, fomos beber, eu fiquei completamente bêbada, dei pra você na escada do nosso antigo prédio e eu só lembro de você me acordando, na porta do meu prédio atual. Eu, que naquela época sonhava em fazer amor com você e você dizia me respeitar, fazia promessa de não tocar em mim e ficávamos nos beijando por horas depois da piscina. Eu, que esperava a manhã inteira o interfone tocar e ele tocava mesmo nas primeiras horas da manhã, e eu ouvia sua voz tímida me chamando pro play. Eu, que era a sua dupla no war e você roubava descaradamente, e a gente ganhava sempre morrendo de rir. Eu, que queria tomar açaí todos os dias, e você que me chamava pra ir pra praia e levava guarda-sol. Eu, que te vi jogando Taco no play e corri lá pra baixo, sem nem conhecer ninguém e fiquei só te olhando, com cachos o cabelo. Eu, que me apaixonei perdidamente e morreria por você, e você, que morreria por mim na mesma intensidade.
Consegui, né? Te fiz me esquecer de vez? Viva minha falta de escrúpulos!
E nem chato você é....
Me desculpe escrever tanto tempo depois. Faz o quê? Uns onze anos? Foi mal mesmo, mas sabe o que foi? Aquel trilhões de e-mails que vc me mandou, eu nem li. Aí não soube o quão fudido eu te deixei... Mas também nem me importou muito na época, eu fiquei com um gatinho que hoje é ator da Globo naquele 18 de fevereiro... Agora até deu pra me perdoar um pouco, né? Ou não? Ah, nem venho aqui te pedir desculpas não, vim te dizer o que aconteceu mesmo. Talvez você tenha sido o primeirão da minha lista. Talvez não, com certeza.
Então, foi o seguinte, você foi a primeira pessoa por quem eu fui apaixonada, e paixão acaba. Quando se tem 17 anos, ela acaba e por você ser imatura, nem dá explicação, mete o pé mesmo, e foi isso que eu fiz. Mas como homem é sempre burro, você ficou lá, se perguntando o porquê de tudo e citando Aristóteles.
Numa boa? Aristóteles e eu não temos absolutamente nada a ver...Acho o cara um pé no saco.
Mas foi isso, querido. A paixão acabou da noite pro dia, um dia eu te amava e achava lindo você tocando sax, falando francês e jogando golfe e no outro dia eu não te amava e achava um pouco brega você tocar sax e jogar golfe. Francês eu continuava achando um charme, mas isso eu não disse pra ninguém.
Ah! Obrigada pela sua carta, foi fofa. Foi digna de alguém que era pra ser o homem da minha vida, você tá de parabéns. Me fez chorar, aliás, me desesperou de tanto chorar, nunca tinha o feito por ninguém. Sério, mandou bem. Eu lembro de ter deitado na cama e achado que ia morrer, pra depois a guardar e não abrir por muitos e muitos anos.
Ô Fred, é um porre falar de você porquê eu me sinto eternamente culpada de ter estragado tudo, sério mesmo, minha mãe me enche o saco dizendo que você era perfeito e não entende porquê eu te larguei.
Você é chato. É muito chato. Um chato!!! Que merda, um chato, chato, chato!!!!!! Chato! Puta que pariu! Por que eu fui tão sacana com você? Por que eu fui reler sua carta muitos anos depois e vi um pedacinho de papel nunca antes visto, escrito:"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Pequeno Príncipe." Porra!!! Custava ser menos inteligente? Eu tinha mesmo que passar alguns anos da minha vida sentada na janela ouvindo você tocar sax lá do sétimo andar?
Ok, estou te promovendo. Meninas, entrem na fila, ele é mesmo tudo isso.
Não vou nem dizer que você é lindo, carinhoso, viaja bastante, se formou em economia, rico, inteligente, dirige um carrão e além de tudo isso, como se não bastasse mais nada, é educado.
Enfim, pra deixar bem claro e terminar de formar toda a imagem podre que você tinha de mim depois de eu ter te deixado entregue às traças, eu resolvi te escrever, você resolveu corresponder, me chamar pra sair, eu por minha vez, aceitar e você ter ido me buscar em casa no seu carrão.
Bem, fomos beber, eu fiquei completamente bêbada, dei pra você na escada do nosso antigo prédio e eu só lembro de você me acordando, na porta do meu prédio atual. Eu, que naquela época sonhava em fazer amor com você e você dizia me respeitar, fazia promessa de não tocar em mim e ficávamos nos beijando por horas depois da piscina. Eu, que esperava a manhã inteira o interfone tocar e ele tocava mesmo nas primeiras horas da manhã, e eu ouvia sua voz tímida me chamando pro play. Eu, que era a sua dupla no war e você roubava descaradamente, e a gente ganhava sempre morrendo de rir. Eu, que queria tomar açaí todos os dias, e você que me chamava pra ir pra praia e levava guarda-sol. Eu, que te vi jogando Taco no play e corri lá pra baixo, sem nem conhecer ninguém e fiquei só te olhando, com cachos o cabelo. Eu, que me apaixonei perdidamente e morreria por você, e você, que morreria por mim na mesma intensidade.
Consegui, né? Te fiz me esquecer de vez? Viva minha falta de escrúpulos!
E nem chato você é....
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